terça-feira, 10 de março de 2015

A PRAIA

A Praia estava bem cheia naquela ensolarada manhã de domingo. O mar calmo e com várias tonalidades de verde e azul num colorido indescritível. Havia pouco espaço para se colocar barraca ou mesmo uma simples toalha. Marina deu um jeito e procurou seu espaço entre cadeiras e piscininhas infantis. Gostava de ir à praia sozinha e vestir sempre um biquíni diferente. Trazia uma bolsa de palha com listas vermelhas e amarelas. Pediu licença e estendeu sua canga onde deu. Usava óculos escuros daqueles impenetráveis. Daqueles que arrefecem raios solares e ocultam verdades reveladas pelo olhar. Passou protetor solar. Tinha a pele branca e os cabelos morenos e lisos até a cintura. Seu nariz era arrebitado e seu corpo inimaginável até para Tom e Vinicius. Uma daquelas mulheres que a areia se transforma num palco quando caminha em direção ao mar. Que os olhares ávidos dos homens desnudam e aquecem e secam e outra coisa por aí. Mas naquele momento Marina estava mais preocupada com seu bronzeado. Deitou de frente para o sol e ficou parada como estátua de deusa esperando o retoque final de Apolo. Mas para surpresa até dos vendedores de mate e biscoito Globo, resolveu tirar a parte de cima do biquíni. Se a sua chegada já havia causado um impacto profundo, maior foi quando aqueles seios perfeitos explodiram livres sob o sol de Ipanema. Primeiro fez-se um silêncio daqueles que só o quebrar das ondas e os gritos das crianças brincando indiferentes rompia. Depois um murmurinho abafado e envergonhado de alguns adultos. Foi como se a praia inteira congelasse por 1 segundo. Até que uma senhora de cabelos grisalhos que estava sentada numa cadeira embaixo de uma barraca gritou:
- O que é isso?? - havia na sua voz uma mistura de indignação e espanto.
Várias pessoas olharam para ela. Muitas esperando uma deixa para exporem seus comentários.
- Que pouca vergonha!!! É por isso que esse país está assim... - disse outra mulher raivosa acendendo um cigarro com as mãos trêmulas.
Marina continuou ali deitada, perdida em seus devaneios.
- Olha mãe!! Parece até com aquela que eu vi num site na casa do Jorginho! - Entregou-se um garoto dos seus 13 anos.
- O quê??? - disse a mãe indignada. - Vou falar com seu pai, Gabriel!
Esperto, Gabriel levantou-se e correu para a água.
Que coisa mais anos 80!! – Continuou outra mulher até bem bonita.
Logo a confusão foi crescendo. Marina continuava desligada, escutando música com fones de ouvido no seu celular. Foi quando um senhor se aproximou e disse:
Minha filha, eu não tenho nada contra, mas tem um monte de gente reclamando do que você está fazendo.
Marina olhou em volta e viu os olhares de reprovação. Sorriu para o senhor.
Mas eu não estou incomodando ninguém. Estou aqui, quietinha no meu lugar. E o que tem mostrar os seios? A gente vê isso todo dia. Até parece...
O senhor suspirou e deu de ombros. Pegou uma latinha de cerveja e voltou para a sua barraca. A mulher até certo ponto bonita voltou a falar.
É por isso que o Brasil está assim...Uma pouca vergonha! Se já não bastassem as bundas na TV e na Internet!
É...Um abuso contra as famílias.- disse a senhora de cabelos grisalhos, mais raivosa ainda.
Chamem o salva-vidas! Ele tem que fazer alguma coisa!
Logo o salva-vidas apareceu. Depois de explicada a situação, o homem aproximou-se da moça e disse:
Olha só... todos estão pedindo para você colocar a parte de cima do biquíni. É atentado ao pudor.
Foi aí que várias pessoas se aproximaram e fizeram um cerco em torno da moça. Daqueles que se fazem quando alguém é atropelado e que cresce rapidamente, pois a desgraça alheia é mais emocionante que um filme de Tarantino.
Atentado ao pudor?Eu não vou colocar não. Quem estiver incomodado, que não olhe. - Alguns rapazes aplaudiram. Mas a maioria desejava no mínimo um linchamento. E o que ninguém percebia era que o mar estava agora com grandes ondas, daquelas que aparecem de repente, logo depois que o temido vento sudoeste chega na Cidade Maravilhosa. Um jovem foi surpreendido pela mudança repentina do mar e se debatia em desespero no meio da espuma branca. Mas as atenções estavam todas voltadas para a morena e seus seios esculturais. A discussão pegava fogo enquanto o garoto bebia muita água.
Olhem! - Finalmente alguém gritou - Tem um menino se afogando!
Rapidamente o salva-vidas saiu com dificuldades da multidão e correu para o mar. Uma mulher começou a gritar:
Gabriel! É meu filho Gabriel! Alguém faça alguma coisa!
Calma – O salva-vidas está colocando os pés de pato...Disse outra
Meu filho!
Aquele foi como um grito de despedida. O menino havia desaparecido entre as enormes ondas. Um surfista tentou procura-lo, mas nada achou. A espuma branca do quebrar das ondas parecia um sorriso cínico do mar.
Três salva-vidas mergulharam várias vezes entre as ondas. Um helicóptero do Corpo de Bombeiros quase tocava as ondas.Tudo em vão. O menino desaparecera.
_- Meu filho! Alguém me ajude!!!
Todos olhavam para ela com um profundo pesar. A mulher caiu em prantos. O helicóptero da polícia sobrevoava o local e alguns mergulhadores pularam na água. Após várias tentativas, um deles emergiu com o garoto nos braços.
Meu filho! Meu filho! – Gritava a mulher desesperada.
A rede do helicóptero foi jogada e trouxe o mergulhador e o menino até a praia. A mãe e várias outras pessoas aproximaram-se rapidamente. Foi tentada a respiração boca-a-boca. Mas o garoto não respondeu a nenhum estímulo. Logo uma multidão cercaram aquele jovem corpo inerte. Como se todos quisessem conhecer de perto a face da morte. Mas tudo que viam era um menino desfigurado e uma mãe desesperada.
Vamos leva-lo ao hospital – disse o salva-vidas.
O mergulhador balançou a cabeça e disse:
- Está morto. Sinto muito, senhora...
A mulher desmaiou. Fez-se um silêncio tibetano. Enquanto isso, Marina pegava todas as suas coisas e saía com passos lentos na direção do calçadão. No rosto deslizavam lágrimas que pingavam sobre os seus seios agora cobertos pelo biquíni rosa.

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